Gabriella.
31 semanas (01/dez/2012).
Junto com
uma pesada caixa de papelão chegou em casa um fino envelope.
Na caixa, o
que será um berço. No envelope, um band-aid de silicone que cobre onde uma vez havia uma tireóide.
O berço é
da bebê sapo que transformou um útero em castelo. A tireóide alojava um
carcinoma papilífero grau VI. Diagnóstico. O procedimento: tireoidectomia
total. A dúvida: quando? Assunto controverso entre a Academia, que dividiu em
dois times os quatro cirurgiões e dois obstetras consultados. A decisão: 100%
minha. Ah, tumorzinho, se fosses maior que teus irrisórios 0.9 x 0.8 x 0.6cm,
tão mais fácil tornarias minha decisão. Cada médico levantava uma dúvida e
expunha opiniões e fatos. Eu queria números, estatísticas, porcentagens. Em
vão. Modelos de análises de risco esperavam em branco por dados inexistentes. A
decisão seria meramente emocional. Intuitiva. Se o tumor aumentar, se virar
metástase, se você não fizer depois que o bebê nascer, se a empresa cancelar o
convênio, se a anestesia geral afetar o bebê, se a cirurgia tiver alguma
complicação, se eu morrer, se o bebê não resistir. Deus, por que me deste um
cobertor tão grande?
Conversa
com sua filhinha, dizia minha mãe. Explica que você vai fazer uma cirurgia e
vai dormir por algumas horas. Pede para ela ficar tranqüila. Fala para ela não
se preocupar e dormir um pouquinho, que vai passar logo. Avisa que é para o bem
de vocês duas. Alguém me ensina a fazer isso sem chorar?
O coração
espremia meus sentimentos e enchia de lágrimas o lençol do hospital. Luz verde,
salinha iluminada, serenidade, harmonia, luz verde, luz verde, luz verde...
Explico.
Nos fundos
de uma casa comprida com um corredor estreito na Vila Mariana, tem uma salinha
pequena onde transborda energia...... é o grupo Noel, Centro Espírita. Nas manhãs
de sábado tenho sido carinhosamente recebida por um seleto grupo que irradia
luz verde em minha tireóide. Ao me despedir após a última sessão, um lembrete
“quando no hospital, pense em nós e na salinha dos fundos”.
Cada
lâmpada no teto aumentava o medo sobre o incerto. O objetivo era avisar todas
aquelas pessoinhas de toca na cabeça que havia um bebê na minha barriga e que
se algo porventura não viesse a ocorrer como planejado, que a prioridade não
fosse eu. Lutava contra o pré-anestésico para ter a certeza que o recado seria
dado. Medo, ansiedade, insegurança... luz verde... Um médico animado se
apresentou. Algumas pessoas da equipe fizeram perguntas.... mas meu mundo só se
acalmou ao ver o cirurgião com seu sorriso acolhedor dizer que se atrasou pois
estava operando uma criança. Completou dizendo que iria cuidar muito bem das
outras duas que o estavam esperando. Busquei refúgio na salinha iluminada
enquanto me entregava às drogas que já não me deixavam retirar as mãos do
ventre...
...
E o bebê?
Fazia força, mas a voz não saía... e o bebê? Ouvia baixinho e torcia para que
me ouvissem também. Está bem, disse um. Nos vemos em alguns meses no parto,
despediu-se outra. Alívio. Alegria. Gratidão. Um mundo de emoções misturava-se
com o bipe das máquinas e equipamentos e o vai-e-vem de funcionários. Tira a
sonda, esforçava-me novamente. Ainda não temos autorização. Tira a sonda.
Doutor, a Erika está incomodada com a sonda, posso retirá-la?
Pelamordedeus, tinham me falado que a
recuperação da anestesia geral seria difícil, mas caraca – dá para tirar essa
p**ra desse fiozionho de dentro da minha uretra que eu não to agüentando!?!!!!
E pensar que colocaram uma sonda de urina no meu avô, enquanto consciente. Afe
Maria, deve ter doído demais. Alguém arranca esse negócio se não eu mesma vou
tirar?? Tem alguém aí??
Obrigada Doutor, vou retirá-la.
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Obrigada Doutor. De coração.
nossa kika. chorei. baixinho pra não acordar a Lis.
ReplyDeleteTe amo!
nasceu uma escritora há pouco, ou já nasceu faz tempo e agora apenas floriu?
ReplyDeleteQuerida....que lindo! A vida realmente é uma mistura de emoções e sentimentos... Mas o melhor de tudo e estar viva hoje para dividir com as pessoas o que vc viveu. Tem muita coisa que não tem explicação, e não adianta tentarmos buscar essas respostas...hoje vivo muito isso. Não tem culpado, não tem razão, não tem o que a gente possa fazer....e isso é o mais aflitivo! Mas você superou, venceu! Curta essa oportunidade que a vida lhe ofereceu! Que Deus ilumine vc e sua pequena e que juntas vocês escrevam muitas histórias lindas! Um beijo
ReplyDeletePuxa Kika...Nossa, como sua vida mudou... faz um tempão que não te vejo, e fiquei surpresa e angustiada em saber o que vc passou. Desejo do fundo do meu coração toda saúde e felicidade do mundo p/ vc e sua Gabi...bjokas... saudades...leda
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ReplyDeleteOlá. Kika, tudo bem?
Li um post e um texto que você fez referente ao câncer da tireoide e achei muito interessante, a história que contou.
Estou fazendo uma matéria exatamente sobre esse tipo de câncer. Se não se importar gostaria de mandar algumas perguntas depois por e-mail referente a doença e sua superação. Sou estudante de jornalismo.
Obrigada.
Como faço para entrar em contato com você?
DeleteNáthaly.
Oi, estou a disposicao: erika.tabacniks@gmail.com
ReplyDeleteBeijos
Kika
Ok,
DeleteObrigada,
Náthaly.
Linda a sua historia, emocionante!!!
ReplyDeleteQue Deus continue te abençoando e iluminando o seu caminho junto a sua filhota linda, vc foi muito guerreira e vendedora!
Beijos e te adoro!!
Raquel